- 20 de agosto de 2025
Erika Klingl Da Equipe do Correio Faltando dez dias para o fim do prazo para apresentação de sugestões à proposta de reforma universitária, o ministro da Educação, Tarso Genro, dá sinais de que pode recuar em alguns pontos para construir um consenso em torno do texto que será enviado ao Congresso em junho. Em entrevista ao Correio, Tarso admitiu que parte dos pontos da reforma não são consensuais nem mesmo dentro do próprio governo, principalmente no Ministério da Fazenda. "Não desconhecemos que existe posição dentro do governo que é mais reativa. É uma posição conservadora sobre a expansão da rede federal", disse. "São pessoas que entendem que o Estado não deve necessariamente jogar recursos importantes na educação pública superior." Para o ministro, a existência de posições distintas em relação à reforma não significa que exista um racha dentro do sistema de ensino superior. De acordo com ele, o que acontece é que as pessoas que se colocam de maneira agressiva contra a proposta são poderosas. "Pode pôr isso aí no Correio: elas são poderosas do ponto de vista político e financeiro, então sua voz é repetida de maneira ampliada", argumentou. "Nós encaramos essa atitude de forma natural, mas não vamos nos render a esses interesses." A seguir trechos da entrevista: -------------------------------------------------------------------------------- Ponto - a- ponto // Tarso Genro Compromisso e coerência "Existem duas questões críticas que surgiram à tona de uma maneira um pouco desordenada. O primeiro trata de dinheiro. Mais precisamente de quanto o Estado brasileiro vai gastar. Vamos gastar mais ou não para expansão das universidades federais? A rede federal, que hoje é modesta, vai ser expandida e qualificada? Essas questões têm que ser processadas na sociedade e também são um dos aspectos essenciais do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Se formos ler os compromissos que o presidente Lula assumiu em relação à universidade pública vamos ver que a proposta do MEC é coerente com esse discurso. Mas não desconhecemos que existe posição dentro do governo que é mais reativa. É uma posição conservadora sobre a expansão da rede federal. São pessoas que entendem que o Estado não deve necessariamente jogar recursos importantes na educação pública superior." Recursos para universidade "O debate está travado entre os ministérios da Educação e da Fazenda. Depois, a Casa Civil que vai definir, sob orientação da Presidência da República, qual o grau de disponibilidade e quais os recursos que a universidade pública merece. Isso tudo vai dizer qual é a importância que o governo está dando para essa relação que o MEC está estabelecendo entre educação superior e o projeto nacional de desenvolvimento. Esse debate está sendo travado, mas não de uma maneira dramática ou desqualificada. Ele existe desde o ano passado. Como existiu dentro do Programa Universidade para Todos (ProUni), que usou recursos públicos excedentes do Tesouro Nacional para pagar bolsas. A discussão no geral está se processando e vai continuar assim até junho." Instituições privadas "O segundo nó da reforma é a questão do setor privado. Não somente a definição de marcos regulatórios mas também sua diferenciação interna do sistema. Não existe só um setor privado. Sem atentar muito para as normas políticas, vejo que existem três tipos de instituições privadas: as empresas educacionais, as comunitárias e as que seriam filantrópicas ou sem fins lucrativos. Boa parte das instituições dessa última categoria encobrem relações de interesse econômico e financeiro. A cada voz que surge contra a reforma é possível perceber quais os interesses que estão por trás. Não quero deslegitimar as críticas que vêm do sistema privado geral. Mas temos que ir separando as que apontam para uma regulamentação democrática das que vêm de empresas disfarçadas. E que se constituíram assim porque existe uma lei da selva de concorrência entre elas, que joga essas instituições numa concorrência que aponta para rebaixamento da qualidade." Pontos inegociáveis "Vamos apresentar o texto em junho ao Congresso, até lá vamos buscar ser o mais consensual possível. Mas não abrimos mão das questões relacionadas com a qualidade, afirmação da escola pública e a definição de marcos sólidos para as instituições não estatais. Ao contrário de alguns críticos da reforma, entendemos que educação não é mercadoria, é um direito público subjetivo. Direito à educação não é a mesma coisa que o direito do consumidor. Educação é um direito para toda comunidade e para toda cidadania." Vozes poderosas "As pessoas que normalmente aparecem de maneira agressiva contra a proposta são muito poderosas, do ponto de vista político e financeiro. Não podemos balizar a reforma somente por essas vozes. Não é verdade que o projeto oponha público e privado. Essa visão é desenvolvida por consultores de instituições privadas que querem base política para fazer andar seus interesses dentro da reforma. Nós encaramos essa atitude de forma natural, mas não vamos nos render a esses interesses. Posso garantir que a reforma vai ao Congresso com os conselhos vinculados à direção das instituições particulares. Há preocupação que esse conselho tenha características normativas, mas isso não vai acontecer. A idéia é transformar o conselho em uma fonte para o diálogo que deve ser considerado pela avaliação do MEC." Mudanças no texto "Estamos dispostos a incorporar algumas sugestões na mudança do texto. Os reitores das federais não querem que as fundações de amparo à pesquisa sejam extintas como determina o texto atual, por isso vamos mantê-las, mas totalmente fiscalizadas e subordinadas ao conselho superior de cada universidade. Também devemos atender à demanda das estaduais paulistas e criar um capítulo inteiro sobre elas. Quem também deve ganhar um capítulo é a categoria de ensino a distância, atendendo uma sugestão do senador Cristovam Buarque (PT-DF). Já está certo que a assistência estudantil terá mecanismos mais fortes de financiamento, como quer a União Nacional dos Estudantes (UNE). Só não está definido quais os termos disso."