- 20 de agosto de 2025
Brasília - Outro dia, enquanto preparava resposta a consulta formulada por um deputado ao presidente da Câmara, tive a necessidade de telefonar a um Ministério, para esclarecer aspecto de certo processo conduzido por aquele órgão. Chamei inicialmente a Consultoria Jurídica. "Não há qualquer consultor no momento, senhor", replicou alguém. "Nesse caso, com quem poderia falar a respeito", insisti. "Vou transferi-lo para a Assessoria de Comunicação Social", retrucou com rapidez o servidor. Quando me preparava para discordar do encaminhamento pretendido, já me encontrava em ligação com outro servidor. Depois de tomar conhecimento do assunto, também este me transferiu, com igual ligeireza, para outro setor. "Sim, senhor. Aqui é do Gabinete do Ministro. Em que posso ajudá-lo?" Agora quem atendia a chamada era uma servidora que, pela voz rouca e pela mesura, talvez excessiva, deveria ser uma senhora avançada na idade e experiente na corte. "Sou da Assessoria Jurídica da Câmara dos Deputados, estou trabalhando num parecer e preciso falar com alguém aí do Ministério que me possa dar informação sobre determinado procedimento desse órgão", repeti já pela terceira vez àquela altura. "Pois não, doutor. Vou pô-lo em contato com a Assessoria Parlamentar", dispôs-se a idosa senhora, com o mesmo sussurro profundo e igual reverência. "Penso que não me fiz entender, senhora. Não sou Deputado nem falo da parte de Parlamentar algum. Sou simplesmente um assessor jurídico à procura de esclarecimento, em tese, acerca do tratamento que esse Ministério dispensa a certa matéria." Desta vez, ao menos tive oportunidade de me explicar antes de ser arbitrariamente encaminhado a outro burocrata. "Doutor, se o senhor está falando da Câmara, tenho de transferi-lo para a Assessoria Parlamentar. Essas são as ordens", persistiu minha interlocutora, agora em tom menos grave e sem a mesma delicadeza. "Senhora, como disse..." "Qual é sua graça, doutor", interrompeu a balzaquiana escolada, com falsa amabilidade. "PINTO", de chofre revidei, com igual cavernosidade de voz com que falava minha interlocutora minutos antes. "Minha graça é Júlio Pinto", arrematei, depois de alguns segundos de silêncio sepulcral. A velha cortesã, evidentemente embaraçada, sem mais demora passou o telefone para o Chefe de Gabinete, que, finalmente, prestou todas as informações de que precisava. É, o velho James Bond nunca falha. * Júlio Pinto é advogado ([email protected]; www.sj.adv.br), assessor jurídico da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, professor de Direito Constitucional e Processo Legislativo no Centro de Formação da Câmara.