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Que seja eterno enquanto dure - (*) Francisco Espiridião

Na próxima segunda-feira, dia 3 de janeiro, completamos, eu e Eliana, 30 anos de casamento. União que nos rendeu três filhas - a caçula, com 20 anos de idade - e um netinho de quase três meses. Ainda que não querendo ser nostálgico, três décadas são, pode-se dizer assim, uma vida. E isso, invariavelmente, empurra-nos a uma reflexão sobre o que foi todo esse tempo, o que ele representa para nós como família e, principalmente, quais as lições de vida que podemos tirar dele.


Na próxima segunda-feira, dia 3 de janeiro, completamos, eu e Eliana, 30 anos de casamento. União que nos rendeu três filhas - a caçula, com 20 anos de idade - e um netinho de quase três meses. Ainda que não querendo ser nostálgico, três décadas são, pode-se dizer assim, uma vida. E isso, invariavelmente, empurra-nos a uma reflexão sobre o que foi todo esse tempo, o que ele representa para nós como família e, principalmente, quais as lições de vida que podemos tirar dele. Parece que foi ontem. Um menino de 20 anos, magérrimo (1,70m, 54 quilos), cheio de sonhos, desembarcava no aeroporto de Boa Vista. Sem um tostão no bolso, depois de passar fome em Manaus - mais pela ingenuidade do que pela falta de recursos -, chegava para assumir o emprego de rádio-telegrafista na agência local dos Correios. Era o dia 30 de abril de 1974. O general Ernesto Geisel assumira a presidência da República havia 15 dias. A falta que a família paterna, deixada em Porto Velho (RO), lhe fazia foi fatal. Provoca-lhe o banzo - doença de negro cativo. Eliana foi a primeira namorada encontrada na terra de Macunaíma. O primeiro encontro aconteceu em julho daquele ano. No dia 3 de janeiro seguinte, seis meses depois, lá estavam os dois, nervosos, diante da juíza de paz, dizendo o "sim", lançando-se nessa aventura desconhecida que era a vida a dois. Natural. Tudo que começa precisa passar por ajustes. Muitas vezes doloridos. E conosco não foi diferente. Andamos nos arranhando um bocado. Mas as vicissitudes não foram capazes de quebrar o elo que nos unia. Hoje, entendemos que esses dissabores foram providenciais. Tiveram como objetivo ajudar na coesão que nos uniu e ainda nos une, a qual nem mesmo o passar dos anos, das décadas, conseguiu arrefecer. Não estou dizendo aqui que entre nós hoje "tudo saia como um som de Tim Maia". Ainda temos nossos saca-rabos. De menor intensidade, é claro. Não chegam a provocar nenhuma itsunâmi. Isso, porque o tempo nos levou a descobrir nossos códigos próprios para superar as adversidades. Colocando na ponta do lápis, nossa convivência já atravessa nada menos que 259 mil e 200 horas, considerados, é claro, os pequenos lapsos involuntários. Nada superior a mais que dois meses de separação. Sempre causados por motivo de trabalho. Apesar de insignificantes, esses períodos de distanciamento físico (não espiritual) serviram para fortalecer a certeza de que, como diz a Bíblia, éramos - e somos - os dois uma só carne. Esses 15 milhões e 552 mil segundos que desfrutamos da convivência um do outro foram suficientes para nos fazer experimentar os mais variados sentimentos. Uns bons, outros nem tanto. Mas foram imprescindíveis para sedimentar, dia após dia, essa construção de vida a dois, a ponto de um não sobreviver a ausência do outro por muito tempo. Agora, nós entendemos o que Vinícius de Morais, o saudoso "Poetinha", quis dizer com o seu decantado "Soneto da Fidelidade". Sabemos que o amor mútuo que experimentamos outrora e continuamos a experimentar, cultivando-o dia a dia como uma débil plantinha sequiosa, não será eterno, "posto que é chama". Mas, quando a noite chegar para um dos dois, o que ficar, ainda que experimentando a insuportável solidão, poderá dizer, sem sombra de dúvida: "Foi infinito enquanto durou". (*) Jornalista, e-mail: [email protected]

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