- 09 de abril de 2025
O grande "espetáculo do crescimento", conforme prometera o presidente Luis Inácio Lula da Silva, começa a dar o ar da graça. Segundo o IBGE, o terceiro trimestre deste ano foi pródigo no que se refere à economia. Em relação ao mesmo período do ano passado, o crescimento do PIB foi de 6,1%. No geral, o Brasil deve fechar o ano 5% maior. Nada mal. Calma. Prudência e canja de galinha não fazem mal a ninguém. Ainda não dá para se afirmar, dentro de uma visão megalomaníaca, que o país vive um verdadeiro "mar de rosas", como fez questão de frisar o presidente Lula, ao rebater as diatribes de Fernando Henrique Cardoso, proferidas na semana passada. Para isso, alguns gargalos precisam, antes, ser eliminados. É claro que ninguém deseja que essa euforia toda não passe de uma bolha de crescimento como tantas outras já vistas em terras tupiniquins. Aliás, para quem teve crescimento negativo em 2003 (-0,2%), 5 pontos porcentuais para este 2004 é algo que deixa qualquer um com a pulga atrás da orelha. Os números começam a mostrar que nem tudo é "céu de brigadeiro". Na indústria, a queda se repete pelo segundo mês, de acordo com dados do IBGE. Após subir nos seis meses anteriores, a queda de setembro foi de 0,2%, seguida de 0,4% em outubro, o pior resultado desde fevereiro. Isso, no entanto, não deve tirar o sono de ninguém, tranqüilizam alguns analistas econômicos. Eles vêem tal flutuação como natural. O curioso é que essa leve queda se dá exatamente quando o Banco Central inicia o processo de elevação da taxa de juros (Selic). Em setembro, o aumento foi de 0,25%; outubro, 0,5%; novembro, mais meio ponto porcentual. Um viés de alta preocupa ainda mais o empresariado brasileiro. Que o diga o vice-presidente e agora ministro José Alencar. Outros gargalos ainda não eliminados podem soar como água na fervura. As relações trabalhistas são um deles. Uma reforma urgente na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é condição sine qua non para maior segurança no setor. O conjunto de leis hoje vigentes é arcaico. Data de 1940. Não é à toa que apenas 39% da força de trabalho hoje conta com alguma garantia trabalhista - carteira assinada. O grosso dos trabalhadores brasileiros está mergulhado na atividade informal, órfão de qualquer benesse que o estado, ainda que precariamente, tenha a oferecer. O resultado disso são os números fornecidos ontem pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância): 27 milhões de crianças brasileiras vivendo abaixo da linha da pobreza. Ainda segundo o documento, 44 milhões de brasileiros vivem em condições sanitárias abaixo do mínimo desejado. Outro ponto de estrangulamento que pode ameaçar o "espetáculo do crescimento" está incrustado no agronegócio. A soja brasileira, que vai fechar esse ano com quebra de safra, tem motivos de sobra para esperar um futuro tenebroso. A supersafra americana, depois de três anos de declínio, ameaça o preço do grão brasileiro já para o próximo ano. A queda do dólar no mercado internacional é outro nó com a ponta escondida. Diga-se de passagem que o agronegócio é o responsável por 40% das exportações nacionais, e por 37% dos novos empregos. Além desses complicadores externos, há ainda os internos. O calcanhar-de-aquiles atende pelo nome de MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra). Organização que planta o terror no campo, com quem o governo até agora não conseguiu acertar a mão. Isso, sem falar no indesejável "fogo amigo", representado por ácidas críticas de atores internos. Fora esses espinhos pontuais, há ainda que se considerar a falta de infra-estrutura. As estradas, assim como as ferrovias, acham-se em condições precárias em todos os quadrantes do País. Não há necessidade de se frisar que tal quadro encarece sobremaneira o transporte da produção. Da mesma forma, os portos brasileiros vivem dias de agonia. Sofrem com a inexistência de meios para a operação a contento, bem como não existem armazéns ou contêineres em número suficiente para a estocagem da produção. O resultado é um custo operacional pelo menos três vezes maior que o verificado nos Estados Unidos, segundo avaliação da revista Veja, desta semana. Tudo, conseqüência do feroz contingenciamento levado a efeito, de forma espartana, durante todo o ano passado. Em seu primeiro ano de gestão, o governo do PT não fez o dever de casa. Se não quiser que a euforia, que inebria os ouvidos dos brasileiros hoje, seja vôo de galinha, o governo precisa extirpar com urgência de suas entranhas a incompetência. Não basta, portanto, só ficar de olho, mexendo os pauzinhos, tentando teleguiar a convenção do PMDB que acontece depois de amanhã. Mas essa é uma outra história. (*) Jornalista