- 20 de agosto de 2025
A Manaus que completa 335 anos é uma cidade que nos últimos 30 anos passou por verdadeiro surto de ampliação da pobreza, de desigualdade social e concentração de renda nas mãos de poucos. Assim, os problemas urbanos e sociais estão por toda parte, em cada uma das extensas zonas nas quais a capital se divide. Existe quem a critique, existe quem a ame, mas há também quem veja soluções para tantos problemas, seja pelo investimento na infra-estrutura urbana ou na reafirmação da identidade do seu povo. Para o antropólogo e professor do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Raimundo Nonato Silva, Manaus pode ser pensada na condição de um "caleidoscópio", com naturezas étnicas que reluzem em cada ponto, revelando uma beleza que é justamente a sua população. No entanto, Nonato avalia que esta beleza acaba sendo ofuscada pelos problemas de infra-estrutura que a cidade possui. "A cidade não foi e não está sendo preparada para o seu desenvolvimento, o que se reflete diretamente na população. Além disso, existe a ausência do poder público em encaminhar soluções para os problemas sociais", declara. Um dos problemas graves de Manaus ainda é a educação, na opinião do antropólogo. Ele afirma que o sistema educacional ainda está sendo pensado de uma forma muito instrumentalizada e técnica, quando deveria ser um promotor da cidadania e vinculá-la ao sentido étnico-amazônida, que ainda é muito desrespeitado. "A educação deveria ser promotora dessa identidade amazônica que proporciona o orgulho de ser manauara", esclarece. Nonato explica que quando o cidadão não descobre a história da cidade, ele não se sente como alguém que a constrói. O professor afirma que é necessário vincular a cidade ao sentido manauara, relacionado à tradição e valores étnicos indígenas, e não ao somente ao termo manauense, que é usado para quem nasce na cidade. "Ser manauara é mais completo que ser manauense", frisa. Urbanismo Para o arquiteto e urbanista Roberto Moita, os anos passam em Manaus, mas os problemas não. Segundo ele, a capital do Amazonas tem à sua frente uma agenda de desafios e a população já está construindo uma autoconsciência sobre a questão. Na visão do especialista, a cidade tem várias carências, entre elas a habitacional que pode ter soluções variadas, uma vez que cada grupo social tem uma necessidade. "Algumas pessoas têm capacidade de pagar pela casa, outras têm capacidade parcial, algumas quase incapacidade e outras absoluta incapacidade. Há gradações distintas que estão ligadas diretamente à condição de renda da família". Diante deste quadro, Moita deduz que o desafio do debate habitacional em Manaus está em realmente definir o que seria o déficit. Segundo ele, o termo vem sendo usado para inclusão das casas de madeira, que são taxadas de habitações precárias. Na opinião do arquiteto, é necessário estabelecer critérios e avaliar com menos preconceito. Ele acrescenta que na verdade a casa de madeira é um modo de habitar que a tradição ocidental e portuguesa qualifica como habitação precária, mas a cultura amazônida não. "É uma casa e se ela estiver fora da área de risco e com condições urbanas como esgoto, água potável, coleta de lixo, acessibilidade, energia elétrica e telefonia, é perfeitamente compatível com os padrões de conforto e habitalidade contemporâneos", defende. Na análise de Moita, o déficit habitacional em Manaus deveria estar mais associado as moradias localizadas em áreas alagadas ou em áreas de encosta, consideradas de risco. Ele destaca que é fundamental que o município reconceitue o problema do déficit para que seja possível dimensionar o problema e encontrar soluções específicas, inclusive para as invasões de terra e crescimento desordenado da cidade. Márcia Daniella